Fim da exigência de diploma para jornalista foi luta de classes

14/11/2024
Benites entrega um exemplar do seu livro para Sílvio Campos
Benites entrega um exemplar do seu livro para Sílvio Campos

*Por Marcello Riella Benites

Tive uma conversa com o querido amigo, Jornalista e podcaster Sílvio Campos sobre o retrocesso que é a não exigência do nível superior em Jornalismo para o exercício da profissão. E foi tão bacana, que pensei em contar um pouco do nosso bate-papo, para quem não sabe sobre o tema, e pra quem sabe e quer saber mais. A conversa aconteceu no Culturando e pode ser assistida abaixo.

É verdade que a exigência do diploma nasceu na ditadura. Os militares queriam escolher quem poderia ser Jornalista. Só que o tiro saiu pela culatra, pois as faculdades formaram profissionais críticos que muito contribuíram com a redemocratização. A imposição do certificado também resultou de reivindicações antigas dos jornalistas, que na época eram mais unidos e mobilizados.

Luta de classes

De 1969 a 2009, a faculdade foi a porta obrigatória para atuar como Jornalista. O que ocorreu nesse período foi luta de classes, entre profissionais que vendiam seu trabalho e donos de empresas jornalísticas que compravam. Aqueles ganhando pouco e querendo receber mais, e estes exigindo muito trabalho e pagando pouco. Quarenta anos depois, venceram os donos da mídia.

Uma das batalhas, entretanto, foi vencida pelos Jornalistas, muito tempo atrás. Na elaboração da Constituição de 1988, um colega famoso, traidor da categoria, participava da comissão que preparava o texto sobre comunicação e queria agradar os proprietários da Folha de S. Paulo. Então, propôs a extinção da obrigatoriedade. Mas os constituintes derrubaram. Afinal, queriam uma Constituição Cidadã.

Como dizíamos no início, houve um tempo em que os jornalistas eram unidos e isso conferia força aos nossos colegas sindicalistas de São Paulo, que pressionavam a Folha por melhores condições de trabalho e renda. E pressionavam muito. A ponto de ser proibida a entrada deles no prédio do jornal. Só podiam afixar avisos no mural. A pressão sindical não diminuiu.

Em 2001, o Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão do Estado de São Paulo, apoiado por forte campanha da Folha, e o Ministério Público propuseram uma ação pelo fim do diploma. Poder privado e jurídico continuaram aliados quando a ação avançou para o Superior Tribunal Federal (STF).

O ministro Gilmar Mendes alegou que a profissão restrita aos Jornalistas diplomados impedia não jornalistas de exercerem a liberdade de expressão. Só o ministro Marco Aurélio discordou. O placar foi 8 a 1. O diploma caiu. Ficamos por aqui nesta conversa inicial sobre o assunto. Da próxima vez, explicaremos a falácia de Gilmar.


* Marcello Riella Benites, autor do livro "A origem da Mídia Ninja no discurso dos jornalistas", é membro do Coletivo de Jornalistas de Macaé (RJ) e Região e realiza a pesquisa "Enfrentamento da Crise da Profissão de Jornalista (Enprojor)" no Programa de Pós-Graduação em Cognição e Linguagem da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro - Uenf.